Pular para o conteúdo principal

Como os brasileiros sentem medo de saber que Espiritismo, aqui, é deturpado



Os textos que denunciam que o Espiritismo é deturpado no Brasil não estão entre os mais lidos. É irônico que os que se declaram oficialmente "espíritas", que se dizem esclarecidos, fogem de medo de textos que apontam que a doutrina é catolicizada, medievalizada, adota um moralismo conservador e bastante retrógrado.

Sabe-se que o "espiritismo" brasileiro - com aspas e minúsculas, mas se referindo ao que oficialmente se acredita ser a "Doutrina dos Espíritos" - tem suas bases originais fundamentadas em Jean-Baptiste Roustaing, através dos conceitos católico-medievais e moralistas trazidos por Os Quatro Evangelhos. O roustanguismo, todavia, causou muita polêmica e hoje ele é dissolvido pela pretensa "recuperação das bases doutrinárias" de Allan Kardec.

A religião é a mais dissimulada do Brasil. Mas é a que tem maior credulidade por parte de seus seguidores, que acreditam que a doutrina brasileira é "equilibrada", mais até do que a doutrina francesa. Isso se dá por dois principais motivos:

1) O "espiritismo" brasileiro evoca a mesma religiosidade do Catolicismo, mas permite a flexibilidade de ritos e outras formalidades que antes não eram estimuladas, o que fazia com que muitos brasileiros se tornassem, antes, "católicos não-praticantes";

2) A tradição de anti-intelectualismo e indisposição ao aprofundamento da Ciência, tão típica nos desempenhos escolares dos brasileiros médios, faz com que eles aceitem uma religião que se diz "científica, mas nem tanto" que, ao mesmo tempo, promete uma pretensão de intelectualismo, mas dentro dos limites aceitáveis pela mediocridade intelectual dominante no nosso país.

A religião "espírita" expressa também a nostalgia oculta dos brasileiros, devido aos romances específicos dessa doutrina e o conteúdo de boa parte das palestras nas reuniões doutrinárias, que remetem a uma espécie de contos de fadas para adultos.

Talvez esse envolvimento emocional extremo que o "espiritismo" brasileiro, através desses entretenimentos, promove nas pessoas, além da mitificação dos seus "sacerdotes", os "médiuns" - como Francisco Cândido Xavier, conhecido como Chico Xavier, e Divaldo Franco - , supostamente associados à "caridade", possa manter os brasileiros presos na sensação confortável da adoração mística a essa religião.

"ESPÍRITAS" NÃO ESTÃO PROTEGIDOS POR BOAS ENERGIAS

Isso faz com que textos que venham a romper com tais sensações sejam boicotados, por mais que estes sejam repletos de fatos e provas irrefutáveis. As sensações emocionais, em muitos casos bastante alucinadas, que envolvem seguidores e simpatizantes do "espiritismo" brasileiro, são tão agradáveis que qualquer ruptura traz um sentimento de insegurança, apreensão e até de irritabilidade.

Daí que, ironicamente, o caráter deturpado do "espiritismo" brasileiro se torna mais evidente pelo medo com que as pessoas reagem a qualquer revelação ou denúncia, por mais realista que sejam estas. Afinal, se elas reagem com insegurança, indignação e até irritação, isso significa que essas pessoas mostram que não se sentem protegidas pela religião que defendem.

Elas chegam a ser ríspidas e até enlouquecidas diante das revelações que lhes podem trazer um risco de decepção. Numa discussão entre um devoto de Chico Xavier, por exemplo, e alguém que lhe revela um detalhe negativo do mesmo, é justamente o apoiador do "médium" que reage com maior desequilíbrio emocional, a ponto de sofrer mal estar e se tornar agressivo ao interlocutor.

Os brasileiros se tornam acostumados com a forma com que se apresenta o "espiritismo" brasileiro, bastante dócil, fantasiosa, agradável. É uma visão tão agradável que as pessoas usam o pensamento desejoso para moldar a "personalidade" dos "médiuns" conforme os desejos de qualquer um, o que é um efeito abusivo da "liberdade de fé" que o "espiritismo" brasileiro traz a seus adeptos.

O Brasil é tomado por tais vícios e começam a surgir alertas sobre o perigo das chamadas "paixões religiosas", que envolvem fortes sensações emocionais, catárticas, fantasiosas e exageradamente deslumbradas, que tornam as pessoas escravas da mística de uma tendência religiosa. Tais paixões não são exclusivas do "espiritismo" brasileiro, mas é nele que elas encontram suas manifestações mais preocupantes que deixam as pessoas com muito medo da realidade em sua volta.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Espiritismo, no Brasil, é reduzido a uma religião de louvor

O igrejismo com que foi tratado o Espiritismo, no Brasil, é muito mais grave do que se imagina e muito mais danoso do que se pode parecer. A catolicização, defendida sob o pretexto de que o Brasil expressa as tradições da religiosidade cristã, impossibilitou a compreensão correta da temática espírita, substituída por valores místicos e uma suposta fraternidade igrejeira que em nada resolve os conflitos humanos existentes. Tudo virou uma religião de mero louvor. Apesar das bajulações a Allan Kardec e da interpretação errada de suas ideias, seus ensinamentos nem de longe são sequer cumpridos e só eventualmente eles servem apenas para serem expostos de maneira distorcida e tendenciosa, de forma a temperar a vaidade explícita mas nunca assumida dos palestrantes e "médiuns". A adoração a Francisco Cândido Xavier, um sujeito de sórdida trajetória - ele se ascendeu às custas de pastiches literários lançados para provocar sensacionalismo - mas depois promovido a um semi-deus e...

A pior divergência sob o rótulo do Espiritismo

ALHOS COM BUGALHOS, JOIO COM O TRIGO - É fácil misturar Allan Kardec com os deturpadores. No Brasil em que se recebe fake news  com uma comodidade ímpar, é fácil misturar o joio com o trigo, os alhos com bugalhos (não, não estamos falando do excelente youtuber  Henry Bugalho). É fácil fazer montagens de fotos misturando Allan Kardec e Jesus de Nazaré com imagens dos deturpadores da Doutrina Espírita e até alguns "espíritos" fictícios. Devemos chamar a atenção, portanto, da diferença entre Emmanuel e Joana de Angelis pois, se o espírito do jesuíta mostra indícios de ter sido evocado por Francisco Cândido Xavier, o mesmo, todavia, não ocorreu com Joana de Angelis, porque ela não foi Joana Angélica, mas antes um pseudônimo do obsessor de Divaldo Franco, o "Máscara de Ferro". Explicaremos isso mais tarde. O que vamos considerar, aqui, é a pior divergência que o chamado "espiritismo à brasileira" tem em relação ao Espiritismo francês e que derruba de vez...

Como explicar, no Brasil, a deturpação do Espiritismo?

A vexaminosa cobertura dos 150 anos de morte de Allan Kardec atentou para uma grande omissão de uma informação importante. A de que o Espiritismo, no Brasil, foi desenvolvido desviando-se dos ensinamentos originais do pedagogo francês. Nem mesmo a BBC Brasil, sucursal da estatal britânica que, na sua equipe brasileira, prima por escrever bons textos de informação abrangente e senso investigativo, se encorajou a cobrir a deturpação do Espiritismo, se limitando a fazer, na prática, um press release  da "Federação Espírita Brasileira". Até o termo "espiritismo à brasileira", que denomina a deturpação, foi apenas mencionado sem que seu significado fosse sequer citado vagamente. A imprensa brasileira, mesmo a de esquerda, praticamente age em silêncio, salvo raras exceções, quanto à deturpação do Espiritismo. Poucos têm a coragem de alertar que a chamada "catolicização do Espiritismo" não é um fenômeno acidental nem ele é resultante de uma "saudável i...