Muitos não conseguem enxergar o conservadorismo convicto de Francisco Cândido Xavier. O Brasil é uma gigantesca bolha social, uma espécie de caixa de vidro cujos limites não são enxergados pelos brasileiros. Se não há como ver conservadorismo em algum fenômeno ou personalidade, é porque os brasileiros, em maioria, são tão conservadores que acham natural o conservadorismo, como se fosse o ar que respiramos.
Chico Xavier foi uma das figuras mais conservadoras de toda a História do Brasil. Praticamente aos níveis dos que elegeram Jair Bolsonaro presidente do Brasil, descontando a questão da violência. Embora sua figura estivesse associada a um aparente pacifismo que o faz, supostamente, separar-se dos conservadores propriamente ditos, ele era obscurantista de tão conservador.
Isso confirma com suas raízes sociais. Ele nasceu numa Pedro Leopoldo rural e atrasada, então um distrito de Santa Luzia, na Grande Belo Horizonte, no ano de 1910, quando a sociedade desses lugares ainda estava saudosa do Segundo Império. A formação religiosa de Chico Xavier é o Catolicismo Apostólico Romano, de essência medieval e bastante ortodoxo, e que era dominante no Brasil no período colonial e até mesmo após a saída dos jesuítas, no final do século XVIII.
Se superestima a divergência de Chico Xavier com a Igreja Católica, alimentando a visão maniqueísta do "movimento espírita" que vilanizava os católicos, em detrimento do "médium", confundido com católico heterodoxo por, supostamente, praticar a mediunidade.
A verdade, todavia, é que Chico Xavier sempre foi um católico ortodoxo. Suas desavenças que o fizeram ser excomungado da Igreja Católica de Pedro Leopoldo tinham mais a ver com supostas psicografias, tanto pelo preconceito católico da "influência diabólica", quanto por ações desonestas denunciadas pelo sobrinho Amauri Xavier, que sofreu campanha difamatória e teria sido envenenado, em 1961, provavelmente por "queima de arquivo".
A imagem supostamente filantrópica - nos mesmos moldes que, hoje, se vê em Luciano Huck - de Chico Xavier também tenta, nas últimas décadas, esconder o seu caráter conservador, com uma propaganda espalhafatosa (que ignora que sua "caridade" aponta detalhes duvidosos, como ela ser praticada não por ele, mas por terceiros nos limites do Assistencialismo e as ações pouco resolverem o problema da miséria no Brasil) que forjou a imagem falsamente progressista do "médium".
Com tantos artifícios, as pessoas ainda se surpreendem quando se fala que Chico Xavier sempre foi conservador e, digamos, ultraconservador, e até se revoltam com essa realidade, achando que podem moldar o "médium" com qualidades que lhes são sempre agradáveis, ainda que fantasiosas. E, ultimamente, quando se fala na moda dos "médiuns imperfeitos", a complacência dos erros é um recurso para preservar, mesmo diante de controvérsias, essas ideias agradáveis.
Uma demonstração de que Chico Xavier, como um católico ortodoxo, sempre apoiou a Teologia do Sofrimento - corrente do Catolicismo medieval, recuperada para os últimos tempos por Santa Teresa de Lisieux e, depois, por Madre Teresa de Calcutá - , está neste depoimento que se dá a seguir e que constituiu em uma de suas mensagens mais conhecidas.
Entendendo a encarnação humana como um "pagamento de dívidas", Chico Xavier corrobora o moralismo punitivista da Teologia do Sofrimento, cuja apologia à desgraça humana é sempre transmitida com uma retórica dócil, que faz crer que o sofrimento extremo e o acúmulo de desgraças e tragédias só produz pessoas melhores. Ignora-se que ditadores, psicopatas, bandidos e gente traiçoeira podem se produzir pela overdose de adversidades, mais do que gênios e pessoas altruístas.
Vejamos a mensagem, extraída do livro As Bênçãos de Chico Xavier, de Carlos A. Baccelli (Ed. Didier):
"— Diz o Evangelho que as nossas provas são um índício, não um fim… Estamos, dentro delas fazendo um vestibular de promoção espiritual ou ficamos sob determinadas dependências…
O nosso espírito tem que estar ajustado às Leis de Deus. Paciência operosa, esperança ativa não são simples palavras… Podemos estar sofrendo, estar aflitos, mas, se estamos desesperados, criando problemas para os outros com os nossos problemas nós não estaremos atravessando os nossos problemas com as nossas almas ligadas às Leis de Deus… Não estamos liberados só porque sofremos; depende de nossa atitude a vitória que desejamos alcançar. Estejamos com o nosso pensamento em Deus, com a nossa alma a doar de si, sem pensar em si… Vamos podar o sofrimento daqueles que Deus nos deu à convivência, para que eles sejam mais felizes; calar as nossas dores, pacificar o nosso próprio espírito quando tudo nos induz ao desespero (…) Existe algo que nós podemos dar sem termos: é a felicidade! Precisamos aprender a sofrer sem mostrar sofrimento, atravessar dificuldade sem colocá-la na pauta dos outros… Estamos matriculados na prova; vamos ver qual será a nota".
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