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A perigosa fascinação obsessiva dos brasileiros por Chico Xavier



Há o que analisar sobre por que uma considerável maioria de brasileiros sente uma fascinação obsessiva por Francisco Cândido Xavier. O conhecido Chico Xavier não apresenta qualidades excepcionais que possam merecer tamanha adoração e mesmo a forma dissimulada de "adoração saudável a uma pessoa imperfeita" não resolve os problemas apresentados.

Assumida ou não, essa idolatria é bastante perigosa. Envolve sentimentos mórbidos, apelos emocionais profundos, porém bastante perigosos, uma adoração que se demonstra tóxica, apesar de respaldada por aparentes apelos associados às virtudes humanas.

A situação é tão grave que Chico Xavier, que na prática teve um passado arrivista - assim como o presidente Jair Bolsonaro, o "médium" se ascendeu em episódios de muita confusão - , é um deturpador do Espiritismo que disse ter seguido e cuja suposta psicografia apresenta graves irregularidades, com provas consistentes, é blindado em tudo quanto é situação. Ultraconservador, Chico Xavier no entanto chegou a receber o apoio até de esquerdistas e ateus.

Isso deve ser explicado através de estudos sobre como se dá a manipulação humana. Como um interiorano, Chico Xavier gostava de circo e através disso aprendeu técnicas de manipulação da mente humana, com a ajuda de seu mentor terreno, o presidente da "Federação Espírita Brasileira", Antônio Wantuil de Freitas, que deu indícios de ser co-autor de vários livros "mediúnicos" de Chico Xavier, como os da série "Humberto de Campos / Irmão X", na verdade escritos pelos dois.

Essas técnicas de manipulação da mente humana incluíram, inicialmente, a hipnose. Havia também um truque ilusionista do "médium" parecer que "recebia mensagens" com os olhos fechados. Nesse truque, os olhos se tornavam semi-fechados, dando a impressão de estarem totalmente cerrados. Mas Chico Xavier estava vendo tudo e, com sua caligrafia, escrevia mensagens que jurava serem "de espíritos do além-túmulo". Investigações constatam que isso não é verdade.

Afinal, há uma certa indecisão dos "espíritas" em dizer se as mensagens foram ditadas pelos espíritos ou se elas haviam sido escritas por eles através de um suposto médium. As mesmas pessoas dizem uma coisa e dizem outra. Outra irregularidade é tomar como "frases de Chico Xavier" frases de nomes como Emmanuel ou Meimei. Afinal, é Emmanuel ou Meimei ou é Chico Xavier? Ainda se falará sobre os problemas lógicos da suposta mediunidade.

Mais tarde, Chico Xavier aprendeu outros truques: a "leitura fria", que é a interpretação subliminar através de reações psicológicas de um entrevistado, o vitimismo que é a reação a situações adversas através de sua colocação como pretensa vítima de uma situação.

Ele teria também aprendido técnicas trazidas pelo livro Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas (How to Win Friends and Influence People), de Dale Carnegie (de 1936, mas publicado no Brasil a partir de 1958), e, no final dos anos 1970, ele conheceu os métodos de Malcolm Muggeridge, o "inventor de santos", para trabalhar a imagem "santificada" de Madre Teresa de Calcutá, acusada de tratamento desumano aos alojados das casas de sua instituição Missionárias da Caridade.

Na velhice, provavelmente a partir de 1974, Chico Xavier começou a trabalhar com mais frequência seu truque mais ambicioso, o "bombardeio de amor", que é o que motivou a idolatria que recebe até hoje, que ocorre postumamente desde 2002.

Mas pode ser que esse truque seja mais antigo que parece. Em 1957, recebendo Humberto de Campos Flho - que sempre manifestou ceticismo em relação à "psicografia" atribuída ao espírito de seu pai - , Chico Xavier o assediou no final de uma reunião num "centro espírita" em Uberaba, sussurrando no ouvido um falsete que desnorteou o rapaz.

O evento também mostrou a Humberto, que atuava na época em TV, práticas de Assistencialismo, como cozinheiras fazendo sopas e a companhia de Humberto Filho na caravana comandada por Chico Xavier pelas áreas pobres da cidade do Triângulo Mineiro. O Assistencialismo é uma caridade de baixos resultados sociais que visa promover mais o "benfeitor", às custas de ações meramente paliativas para os mais necessitados, que só superficialmente resolvem o problema da pobreza.

A partir daí, Humberto de Campos Filho saiu deslumbrado. Durante o abraço de Chico Xavier, quando este lhe deu o estranho sussurro, o filho do autor maranhense chorou copiosamente, tomado de "bombardeio de amor", que desenvolveu nele a fascinação obsessiva pelo "médium". A fascinação obsessiva é uma perigosa sensação emotiva correspondente à reação ao "canto-de-sereia" descrito na Odisseia de Homero.

O "bombardeio de amor", na verdade o "canto-de-sereia" moderno, é uma técnica de manipulação mental pouco conhecida no Brasil. Apesar do nome, ela é bastante perigosa, sendo um método traiçoeiro de dominação, pela sua assustadora eficácia. Nela, apelos que envolvem desde beleza profunda até pretensa afetividade, e seu efeito traiçoeiro consiste em dominar até mesmo pessoas consideradas céticas ou dotadas de algum grau de esclarecimento.

A técnica do "bombardeio de amor" (do inglês love bombing) promove a fascinação obsessiva em torno de Chico Xavier, com uma engenhosa simbologia que o fez, através de um repertório discursivo inspirado em Malcolm Muggeridge, um pretenso símbolo de caridade e de fraternidade. Só mesmo num país emocionalmente vulnerável como o Brasil para que um deturpador do Espiritismo, criador das chamadas psicografakes e reacionário seja promovido a suposto filantropo e pacifista.

A "caridade" serve como blindagem e carteirada de Chico Xavier. Virou até um refrão surrado: "ele deturpou o Espiritismo, mas pelo menos fez caridade", "ele defendeu a ditadura militar, mas pelo menos fez caridade", "ele acreditava em ETs, mas pelo menos fez caridade", "ele odiava o PT, mas pelo menos fez caridade" etc etc etc.

O grande problema é que nem a caridade era praticada por Chico Xavier, a contar pelos seguintes problemas:

1) Ele pedia aos outros para ajudar com donativos e trabalhos voluntários. Da parte dele, quase nada saía. É como uma cigarra que pede para as formigas trabalharem e, depois, fica com o mérito pessoal pelo trabalho alheio;

2) Doar dinheiro do lucro dos livros para instituições "espíritas" não é caridade; qualquer celebridade recusa cachê não é o mesmo que dar dinheiro, sendo apenas desvio de renda para outros fins, o que não é errado, mas não traz enobrecimento algum;

3) A "caridade" associada a Chico Xavier, como vemos, está associada ao Assistencialismo, a "caridade" que nunca transforma, apesar dos "espíritas" alegarem ser "Assistência Social", esta sim uma "caridade" que enfrenta os problemas das desigualdades sociais, mas nunca praticada pela referida religião;

4) As "cartas mediúnicas", tidas como "a maior caridade de Chico Xavier", eram na verdade processos traiçoeiros, que envolvem produção de mensagens fake, promoção de sensacionalismo, provocação de sentimentos obsessivos, ansiedade e morbidez por parte de parentes dos mortos e a glamourização da tragédia humana.

Sobre a glamourização da tragédia humana, há que se considerar um dado subliminar. Como havia muitas mortes nos bastidores da ditadura militar - abertamente apoiada por Chico Xavier, cujo ultraconservadorismo não deveria ser subestimado pelos brasileiros - , as "cartas mediúnicas" serviam para dizer que, se os cidadãos comuns que morrem "estão bem no além-túmulo", as vítimas da tortura ditatorial "estão melhor ainda".

Através de todos esses detalhes, foi construída uma imagem de um suposto ativista religioso, de um pretenso humanista, cuja propaganda estimulou sentimentos bastante obsessivos, que vão desde a zona de conforto de atribuir a uma pessoa, não necessariamente tão bondosa quanto se imagina ter sido, uma síntese de virtudes humanas que poucos têm coragem de desenvolver dentro de si mesmos, a um pretenso pacifista de momentos de convulsão social.

Só que isso é um prêmio à desonestidade humana, pois muito do que Chico Xavier fez foi desonesto e que pode ser confirmado com argumentos e provas consistentes, como as "psicografias" que apresentam irregularidades vergonhosas que comprometem uma mínima atribuição de possível veracidade.

Só o caso de Humberto de Campos, cuja "psicografia" foge dos mais básicos aspectos pessoais do autor maranhense, já comprova a carreira desonesta e arrivista de Chico Xavier, cuja adoração por parte de seus seguidores deveria ser vista como um sério problema, por envolver sentimentos obsessivos que, de vez em quando, transformam chiquistas em verdadeiras bestas-feras.

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