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"Moralismo espírita" adota padrão precário de vida humana



Você já ouviu falar das pregações moralistas do "movimento espírita". A ideia de "não querer muito" e as tarefas mais restritas, ligadas ao Assistencialismo, como se isso fosse tudo na vida humana, embora longe da natureza dinâmica da vida material.

É por isso que o "espiritismo" brasileiro adota uma visão simplória e precária de reencarnação. Os indivíduos são recomendados a basicamente serem cozinheiros de refeitórios, enfermeiros, trabalhadores braçais, professores (dentro de padrões anódinos aceitos por modelos como a Escola Sem Partido).

A "vida material" padrão do "espiritismo" brasileiro se assemelha a uma zona rural. Lá só existem hospitais, refeitórios, escolas. O entretenimento mal varia entre uma praça e um parquinho para crianças. A alegria, meramente o de olhar o céu, ver a paisagem e ouvir os passarinhos cantarem. Tudo parece maravilhoso, mas revela a falta de visão dos "espíritas" que fazem seu julgamento de valor diante do sofrimento alheio.

Se o sujeito quer ser um músico, está a fim de uma mulher bastante culta, bem humorada e fisicamente atraente, e as adversidades da vida lhe negam tais oportunidades, os conselheiros "espíritas" lhe dirigem o costumeiro juízo de valor, como neste hipotético diálogo entre o desventurado e um tarefeiro do auxílio fraterno de um "centro espírita":

TAREFEIRO - Amigo, é possível que aquilo que você mais quer na vida não é bom para você. A vida lhe mostra adversidades para lhe indicar um outro caminho que lhe seja mais proveitoso. Muitos desejos são fontes de armadilhas maliciosas.

DESVENTURADO - Armadilhas? E na vida amorosa? Conheci uma garota com a qual me dei sempre bem, tínhamos afinidades profundas e o destino nos separou! Enquanto isso, outra mulher que nada tem a ver comigo, uma periguete da vizinhança, está à fim de mim, embora ela tenha outro pretendente que, se souber disso, irá me matar!

TAREFEIRO - Meu amigo, é essa a oportunidade da vida. Às vezes quando surgem impasses e situações adversas e desagradáveis, é nelas que há grandes chances de progresso. Quanto à periguete, a chance é relacionar com ela na base do diálogo e do entendimento, que pode se estender ao irmão pretendente que pode se acalmar com uma boa conversa.

O diálogo parece bonito e a sociedade brasileira tende a dar razão ao tarefeiro, com base nos seguintes pontos de vista:

1) A sociedade brasileira dominante costuma ser egoísta nas suas compreensões do mundo e a individualidade alheia lhes é alvo de desprezo e reprovação;

2) O prestígio religioso garante ao tarefeiro estar sempre certo e, portanto, no direito de ficar com a palavra final no seu julgamento de valor;

3) A atribuição do item anterior não se desfaz diante da onda dos "espíritas que erram" que virou moda na retórica da chamada opinião pública. O prestígio religioso permite que pessoas "que erram muito", mesmo assim, gozem da "superioridade" enrustida pelo discurso da "imperfeição".

A sociedade brasileira é mais conservadora do que se imagina, e, no que se diz ao "espiritismo" brasileiro, uma religião ultraconservadora mascarada por um verniz "progressista", que arma um discurso bem feito que dificulta sensações de desconfiança, isso se torna explícito.

E isso toma como modelo uma sociedade rural, patriarcalista, coronelista, alternando ranços de terra arrasada com paisagens bucólicas e jeito interiorano, um modelo atrasado que guia o repertório moralista e os juízos de valor acerca do sofrimento humano.

Dessa forma, até a vida moderna é vista pelos "espíritas" com os olhos do atraso, como se o "espiritismo" vivesse ainda num feudo medieval e nele visse ainda uma "atualidade" que julga estar acima dos tempos, mas é simplesmente bastante atrasada.

É através dessa visão que o "espiritismo" deixa de compreender melhor e dignamente o sentimento humano, forçando a pessoa a aguentar adversidades, atuar em servidão, ficar olhando passarinhos e aceitar novidades qualquer nota.

Daí que os "espíritas" não conseguem entender por que um sujeito reclama de só atrair periguetes, estas mais preocupadas com a geometria de seus glúteos do que em formar uma personalidade digna, e ainda aconselha o desventurado a aceitar uma delas. O "espiritismo" brasileiro vive na Idade Média e dela concebe o seu ideal de vida. Preso no seu igrejismo, pouco importa, para o "espiritismo" brasileiro, a complexidade da individualidade alheia.

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